terça-feira, 29 de janeiro de 2013

As Aventuras de Pi

      Muitas pessoas julgam o livro pela capa, e isso tem ocorrido com esse filme: Life of Pi. Acontece que, quando as pessoas visualizam o pôster por aí, um garoto, um barco e um tigre de bengala, criam o (pré) conceito de que o filme é supostamente infantil – ainda mais por traduzirem o filme colocando “As Aventuras de” no título. Mas não é nada disso. “A Vida de Pi”, como seria o título em sua tradução literal, possui um conteúdo muito maior do que qualquer um possa imaginar. É um filme que busca a verdade sobre Deus, seu filho e sobre todo o universo. E, acima de tudo, é uma verdadeira história de amor e amizade. É um filme sobre um garoto que procura por algum sentido da vida nesse imenso mundo.

LIFE OF PI (2012)


(Mesmo quando Deus parecia ter me abandonado, ele estava observando. 
Mesmo quando ele parecia indiferente ao meu sofrimento, ele estava observando. 
E quando eu estava além de toda a esperança de salvação, ele me deu descanso.
 Então ele deu-me um sinal para continuar minha jornada.)

      Dirigido por Ang Lee (que já ganhou Oscar com o filme O Segredo de Brokeback Mountain), o filme conta a história de como o garoto chamado Piscine Molitor Patel sobreviveu quando mais nada lhe restava – apenas a companhia de um tigre que, como animal selvagem e carnívoro, tornava perigosa sua presença.

      A história começa com Pi adulto e com um escritor visitando sua casa. O escritor precisa de inspiração para um novo romance, e ficou sabendo que Pi contaria uma história que lhe faria acreditar em Deus. Pi, então, como narrador em primeira pessoa, inicia a história que para muitos foi considerada falsa.


      O nome Piscine é explicado já no início do filme, e Pi é apenas seu apelido. Criado em um zoológico, desde a infância o garoto sofreu por ter recebido este nome (Piscina) e sempre foi alvo de piadas. Só que Pi era um garoto diferente e inquieto mentalmente: ele não se contentava em saber que o dito Deus, todo poderoso, mandou seu próprio filho para que sofresse e morresse por todos os culpados. Para ele, nada disso fazia sentido. Então ele resolve se aproximar mais da religião – neste caso, do Cristianismo. Quanto mais recebe os ensinamentos de um padre, mais as coisas ficam claras em sua mente, e cada vez mais perto de Deus ele consegue se encontrar. Só que Pi não se contenta apenas com isso. Ele busca em outras religiões as respostas que ainda não conseguiu encontrar – assim, ele passa a praticar o Islamismo, conhecendo o deus Allah. 



      O pai de Pi explica a ele que não se pode seguir tantas religiões ao mesmo tempo, pois acreditar em tudo é o mesmo que acreditar em nada. Mas Pi ainda não encontrou um sentido na existência de algum Deus, e precisa descobrir quem ele realmente é e qual o sentido de todas as coisas que acontecem em sua vida. E tudo isso será provado a ele com um naufrágio: indo embora da Índia, uma tempestade faz seu navio afundar. Mas ele sobrevive. Ele, uma hiena, uma zebra, um orangotango e, finalmente, um tigre de bengala, todo salvos por um bote.

      E é o que acontece: Pi fica sozinho dentro um bote, em alto mar, sem ajuda nenhuma, com um tigre perigoso que a todo momento tenta atacá-lo. Dias, semanas e meses se passam, e apenas com a ajuda de um livro, um lápis e uma faca, Pi consegue colocar as coisas em ordem e, acima de tudo, consegue domar o tigre, que aceita sua presença como se fosse da própria espécie.



      A fotografia desse filme é sensacional. O mar, os animais, as coisas que Pi consegue ver e presenciar são incríveis. Em muitas dessas cenas o diretor usou e abusou dos efeitos especiais, tudo isso para nos lembrar de que a história é a versão relatada por Pi, ou seja, cabe a nós acreditarmos ou não se o garoto passou realmente por aquelas experiências. De acordo com Pi, todos esses acontecimentos ocorreram na vida dele para que Deus pudesse participar de sua história e demonstrar sua existência e sua presença eterna, tanto nos momentos bons quanto nos ruins.

      No final do filme, Pi conta outra versão de sua própria história, que seria mais próxima da realidade (uma história onde os animais sobreviventes eram substituídos por pessoas que estavam no navio). Ele mesmo dá a opção de escolha àquele escritor para quem contou sua história – cada um decide acreditar no que quer, independentemente da verdade.




      Enfim, é isso: o filme é belo, pois trata do tema religião de forma ampla, e não focando apenas em uma crença. Ninguém está tentando impor nada sobre ninguém: como eu já disse, Pi contou sua história, a história que fez ele acreditar em Deus e encontrar todo o sentido para sua vida, e, no final, contou outra versão e deixou a opção de escolha para quem quisesse ou não acreditar em sua versão principal. Além do mais, o filme trata da relação entre a família e os comportamentos que as pessoas podem desenvolver quando se tornam solitárias demais.

      De certa forma, Pi só sobreviveu ao naufrágio por ter a presença do tigre, chamado Richard Parker, ao seu lado. A força para seguir em frente, na tentativa de sobreviver, foi encontrada neste animal. Além de tudo, também é uma história de amizade. O filme mostra que, em situações críticas, coisas aparentemente impossíveis, como a relação entre um garoto e um tigre e a criação de uma amizade e proteção inimagináveis são realmente possíveis, e, de acordo com Pi, graças a presença de Deus.

      Eu ainda tenho minhas dúvidas sobre esse assunto: não sei se acredito em tal força tão superior (vulgo Deus) ou não. Eu ainda preciso de muitas respostas, antes de encontrar o verdadeiro sentido da vida e do universo. Mas não é por isso que eu deixaria de apreciar o filme, que além de ter uma linda fotografia, mostra o poder da fé, do amor e da amizade. Acredito que tenha sido uma ótima indicação ao Oscar.




      Curiosidades:

      O filme é baseado em um livro BRASILEIRO! O autor, Moacyr Scliar, faleceu em 2011, mas deixou em sua carreira esta obra, cujo nome é “Max e os Felinos”. Em 2002, houve uma polêmica entre ele e o escritor canadense Yann Martel, autor do livro “Life of Pi”, que foi acusado de plágio. Toda a polêmica começou quando Yann ganhou o importante Prêmio Booker que, nos países ingleses, é considerado como um passo anterior ao Nobel. 

      Em sua defesa, Yann Martel, que ganhou nada mais, nada menos que 75 mil dólares com o Prêmio Booker, alega que apenas tirou inspiração do livro Max e os Felinos após ter lido uma resenha de um autor americano, mas que nunca leu o livro em questão. Em suas palavras:

      "Eu emprestei a premissa de um livro que não havia lido. Agradeço a Scliar em minha 'nota do autor' pela 'faísca devida' e o mencionei em todas as entrevistas que concedi sobre 'Life of Pi'. Meu único encontro com Max e os Felinos foi através da resenha. E isso foi o que ela representou para mim: uma faísca que colocou fogo em minha imaginação e me incentivou para que eu contasse minha história". 

      Fonte: http://www.correiomariliense.com.br/materia.php?materia=32180.


      No vídeo abaixo há um depoimento do próprio Moacyr sobre esse acontecimento: 


      Sendo plágio ou não, Ang Lee fez um ótimo filme.

      Link para download (formatos AVI, MP4 e Blu-Ray):
      Clique aqui.

Resenha por: Rebeca Reale

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

O Encanto das Fadas

      Um filme que esteve presente durante toda a minha vida. Fadas, magia, fé – são essas as três coisas que estão presentes nesta linda história e, apesar de parecer infantil, é uma lição maravilhosa sobre o poder da nossa capacidade de acreditar.

FAIRYTALE: A TRUE STORY (1997)


      Dirigido por Charles Sturridge, a história se passa em 1917, e é baseada num fato real: o caso das Fadas de Cottingley. As primas Elsie Wright, de 16 anos, e Frances Griffiths, de 10, relataram que tiveram contato com fadas e conseguiram demonstrar este feito através de fotos. Na época, houve grande comoção entre jornalistas e fotógrafos, todos possuídos pela imensa curiosidade em saber se o que viam era real ou falso, e outros, ainda, com a única intenção de desvendar o mistério acusando-as de que suas fotos não eram verdadeiras.

      (Frances e Elsie, respectivamente)

      O pai de Frances está na guerra, então ela procura sempre depositar sua fé em coisas que lhe façam bem. Ela e sua prima, Elsie, são admiradoras de fadas e tentam, de todos os modos, entrar em contato com elas. Elas cantam, elas recitam poemas, elas chamam as fadas. Porém, no início, elas não obtêm sucesso; as fadas, como criaturas frágeis que são, têm medo de se exibirem e virarem uma exposição de circo para os olhos humanos.

      A situação se reverte – as fadas confiam nas duas garotas. Elas aparecem para elas e passam a fazer contato. Só que, mais uma vez, o que era pra se manter em segredo é espalhado com um sopro ao vento. As garotas ganham uma câmera nova e, com o intuito de provar que as fadas realmente existem, conseguem fotografá-las de forma escondida.


      Quando exibem as fotos ao pai de Elsie, ele não acredita e tem veemência quando afirma que as imagens são forjadas e que as fadas são feitas de papel e montadas de modo a parecem reais. Ele fica com as fotos para analisá-las (pois é fotógrafo), e tenta ocultar este fato de sua esposa (mãe de Elsie). Ele age desse modo, pois, anos atrás, tiveram um filho que morreu de pneumonia – um garoto fascinado por fadas e que sempre afirmou que elas eram reais. A mãe não superou essa morte e, sempre que entrava em contato com qualquer coisa relacionada ao filho, ficava em depressão.

      Essa é uma das fotos verdadeiras, mostrando Elsie com as fadas:


      Num momento de distração, a mãe tem contato com as fotos. Ela quer, realmente, do fundo do coração, acreditar que o que está vendo é real, porém ainda tem suas dúvidas. Ela passa a frequentar uma sociedade teosófica, onde o palestrante e todos os membros afirmam que criaturas de outro mundo são reais – como fadas e fantasmas. Pessoas relatam acontecimentos onde foi possível visualizar estes seres e, assim, a fé que a mãe de Elsie possui aumenta, e ela também passa a acreditar em fadas.

      Mas os meios de prova nunca são suficientes, né? Quem acredita, acredita, e ponto final. Mas essa capacidade de fé é inferior ao que realmente deveria existir nas pessoas e, por esse motivo, os pais de Elsie entregam as fotos a Edward Gardner, membro da sociedade teosófica, a fim de que ele as analise. Uma das crenças centrais da teosofia é que a humanidade está passando por um ciclo de evolução, no sentido de aumentar a "perfeição", e Gardner reconheceu a potencial importância das fotografias para o movimento.


      Não me recordo se esta frase dita por Edward está presente no filme, mas, em se tratando de uma história real, eis aqui suas palavras:

      “...o fato de que duas jovens não só tinham sido capaz de ver fadas, o que outros já haviam feito, mas, na verdade, pela primeira vez, serem capazes de materializá-las a uma densidade suficiente para que suas imagens fossem gravadas em uma chapa fotográfica, significou que era possível que o próximo ciclo de evolução estivesse em curso.”

      Ainda, no filme aparece uma figura histórica: Sir Arthur Conan Doyle (famoso escritor de Sherlock Holmes), que, na vida real, teve sua atenção voltada para as fotos das fadas. Como espiritualista, ele interpretou as fotos como evidências de fenômenos psíquicos. Ele fazia parte do público que também acreditava em fadas.

      Muitos fotógrafos, na época, confirmaram que as fotos eram amadoras, porém reais; que não havia nenhum truque, como fotógrafos profissionais costumavam fazer. A possibilidade de dupla-exposição da foto, portanto, foi excluída. Mas agora vem uma informação triste: na edição da Science, de 1983, Elsie e Frances confessaram que as fotografias eram falsas, feitas de papelão/cartolina e recortadas a mão, com figuras de um livro de crianças que era popular na época.

      Mas também há a parte boa: Elsie e Frances afirmaram que, apesar de as fotografias serem falsas, elas realmente viram as fadas. E mais: Frances admitiu que a quinta e última fotografia era realmente genuína. As fotografias e duas das câmeras utilizadas estão em exposição no National Media Museum, em Bradford (Inglaterra).

(Quatro das cinco fotos verdadeiras - a quinta e última foto, dita por Frances ser genuína, não foi encontrada - pelo menos não por mim)

      Esse vídeo mostra a confissão das duas garotas (já velhas), afirmando que as fotos (infelizmente) são falsas, e que não se arrependem da “brincadeira” que fizeram:


      Mas e aí, vocês acreditam? De tantas coisas que existem no mundo, essa é uma das que eu acredito. Pode parecer infantil, burrice, estupidez, enfim, várias coisas. Mas e se existirem mesmo? É difícil provar, mas pra quem acredita de verdade, a prova que a fé nos traz é mais que suficiente. Por isso eu digo sem vergonha: eu acredito em fadas!


      Vale lembrar, também, que na época a repercussão dessa história trouxe também muitos benefícios: pessoas que eram doentes passaram acreditar em milagres, e quem antes não possuía nenhuma fé na vida, nenhuma esperança em relação a qualquer coisa, teve sua vida modificada por esses acontecimentos. No fim, cabe essa lição: não importa se é real ou não – o que importa é se você acredita e se isso vai te fazer bem ou mal!

      E, pra quem quiser saber mais sobre a história das fadas de Cottingley:

      Link para download (torrent + legenda):
      Deixe seu e-mail nos comentários que eu envio!

Resenha por: Rebeca Reale

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

O Homem de Palha

      Pensem num filme que eu demorei pra digerir. Mas, depois de um tempo, gostei. =)

THE WICKER MAN (1973)



      O sargento Neil Howie, interpretado por Edward Woodward, é um policial cristão fervoroso e conservador. Seu amor pela Igreja e ensinamentos cristãos chegam a ser alvo de sarro por parte dos companheiros de polícia. O sargento, então, é reportado para investigar o desaparecimento de Rowan Morrison (Geraldine Cowper), na estranha ilha escocesa de Summerisle.



      Estranha para Howie, claro, pois é uma ilha pagã. E que cultua e festeja seu paganismo sem se importar com a presença do sargento. Pra vocês terem uma noção, eles adoram um pênis, pois representa a fertilidade. Além disso, há deuses para o sol, para a terra etc. A questão é que, assim que o policial põe os pés na ilha, ele já sente alguma coisa “muito errada” pois, ao perguntar por Rowan, e, inclusive, mostrar a foto, todos os moradores se fingem de desentendidos. 



      Até a professora da ilha, Miss Rose (Diane Cilento), age como se a garota não tivesse existido. Só depois de muita pressão ela fala que Rowan morreu. E nem diz assim, claramente, porque explica que em Summerisle não se usa a palavra morte. Enfim, Howie pretende exumar o corpo da menina para dar o caso por encerrado, mas, para isso, precisa da autorização do dono da ilha, o Lord Summerisle – interpretado por Christopher Lee.


      O Lord completa a estranheza do lugar, digamos. Ele tem uma personalidade tranquila, serena, que constrasta com a agressividade de Howie (que, cá pra nós, é só um modo de se defender de tanta coisa estranha pra ele). Ele não se nega a deixar o policial abrir o túmulo de Rowan e, inclusive, na visita que Howie lhe faz, ele conta um pouco da história da ilha e fala mais sobre seus costumes.


      A questão é que – E ESSA É A ÚLTIMA COISA DO FILME QUE EU POSSO FALAR SEM DAR SPOILER – a exumação do corpo não ajuda em nada nas investigações. O corpo da jovem não tá na tumba; no lugar, há um coelho. Essa é gota d’água para que Howie fique ainda mais desconfiado do povo daquela ilha, e comece uma verdadeira caçada à Rowan Morrison.


      Vale lembrar que Howie fica hospedado na Green Man Inn (Taverna Homem Verde), cujo dono, Alder MacGreagor (Lindsay Kemp) tem uma filha belíssima, Willow (Britt Ekland). Inicialmente de forma discreta, e depois, de modo mais latente, perturba o sargento, que se vê dividido por suas crenças cristãs e a beleza daquela moça.



      The Wicker Man é um filme que, pelo menos na minha opinião, não pode ser definido por uma só palavra. É perturbador, erótico, estranho. PRINCIPALMENTE ESTRANHO. Mas não o é de um modo pejorativo, não; é como se fosse uma coisa muito nova sendo mostrada. Apesar de o filme ser de 1973, e tantos outros filmes de temática parecida terem estreado, pra mim foi tudo muito novo, e “assustador”. 

      Pelo que andei pesquisando na interwebs, em 2006 fizeram um remake de The Wicker Man, traduzido em terras brazucas como O Sacrifício, e protagonizado pelo Nicolas Cage. Não assisti a ele, mas não vi críticas muito boas por aí. Não entrarei no mérito, mas quero deixar registrado aqui que remakes estão num campo perigoso, porque a cobrança sempre será muito maior. Enfim, há remakes bons e ruins, e cada um forma sua própria opinião.


      VOLTANDO AO ASSUNTO (foco, Stephanie, haha), falei lá em cima que demorei pra digerir The Wicker Man. E demorei mesmo. Talvez eu só não tenha gostado muito do final, por isso fiquei na revolta. Mas a verdade é que esse filme é uma obra de arte, do seu jeito, porque sabe expor a cultura daquela ilha sem se tornar entediante ou pejorativo. Enfim, gostei. Assistam. =)


      Antes de ir embora, encontrei algumas curiosidades sobre esse filme. 
      Vamos a elas:

- Existe uma música do Iron Maiden (uma das minhas bandas favoritas) chamada “The Wicker Man”. As últimas duas frases da música têm relação com o final do filme;

- Na cena em que Willow (Britt Ekland) dança nua sensualmente no quarto ao lado de Howie, parte das cenas foi feita por um dublê de corpo;

- Há um documentário, de 35 minutos, chamado “O Enigma do Homem de Palha”, que explica algumas cenas do filme, bem como seu processo de gravação;

- Devido ao baixo orçamento utilizado para esse filme, Christopher Lee chegou a afirmar que aceitou "trabalhar de graça".

Resenha por: Stephanie Eschiapati

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Lolita

      She was Lo, plain Lo in the morning. Standing four feet ten in one sock. She was Lola in slacks. She was Dolly at school. She was Dolores on the dotted line. But in my arms she was always… Lolita. Light of my life. Fire of my loins. My sin, my soul. Lo-lee-ta…

LOLITA (1997)


      Para os críticos de plantão, que continuam a insistir em certos tópicos, estou alterando o presente post para uma abordagem mais esclarecedora dos "fatos". Não são poucas as pessoas que surgem com comentários a respeito de pedofilia. Sendo assim, para que eu não passe por maluca ao sustentar meu apoio aos sentimentos de Humbert Humbert, alguns esclarecimentos se fazem necessários. Vamos lá.

      Primeiramente, em nossa legislação penal, há o artigo 213, denominado "estupro". Em seu parágrafo primeiro, está presente o que conhecemos popularmente como "pedofilia". Nos termos do referido artigo, é crime "constranger alguém (...) a ter conjunção carnal ou praticar (...) outro ato libidinoso" e, em seu parágrafo primeiro, o crime é qualificado se "a vítima é menor de 18 ou maior de 14 anos".

      O presente blog faz resenha de filmes, não de livros. Tudo bem que o filme Lolita é baseado no livro de mesmo nome, do autor Vladimir Nabokov, mas estamos aqui para falar do filme, da adaptação cinematográfica, e não do livro em si, ok? Isso significa que, por mais fiel que o filme seja à obra literária, sempre existirão algumas divergências. Então, o que tiver em comum com o livro, eu citarei; caso contrário, não.

      Então, para quem não sabe, a Lolita do nosso filme possui 14 anos. Mesmo assim, de acordo com o parágrafo primeiro do artigo acima citado, ela se enquadraria como vítima de estupro, correto? Correto.

      Quem viu o filme (e isso acontece tanto no livro quanto no filme), sabe que o sedutor na história, no caso, a sedutora, foi Dolores Haze. Foi ela quem deu os primeiros passos. Humbert, até então, era só um observador. Lolita sempre foi maléfica, pois isso era parte de sua natureza de ninfeta (uma natureza demoníaca). Ela nunca demonstrou amor por Humbert, somente indiferença. Quanto mais desprezo ela demonstrava, maior era sua satisfação.

      De acordo com o nosso Código Penal, a pessoa maior de 14 anos tem discernimento suficiente para exercer a sua liberdade sexual. Já podemos, aqui, excluir a incidência do crime “estupro de vulnerável”, pois Lolita tinha mais de 14 anos. Mas, mesmo assim, o estupro qualificado do parágrafo primeiro ainda se aplicaria a ela. Entretanto, existe entendimento jurisprudencial que relativiza o crime nesses casos, quando a suposta vítima, na verdade, não era exatamente uma vítima (ou seja, consentiu com a prática dos atos sexuais e tinha plena consciência do que fazia). Neste sentido, vide Habeas Corpus nº 73.662/1996.

      Só mais alguns questionamentos: como vocês podem dizer que Lolita não tinha consciência plena de seus atos (com seus 14 anos) se, quando ela foge de Humbert, ela vai direto para Quilty, um homem com a mesma idade (ou até mais velho) que seu padrasto e, ainda, que fazia de sua casa um prostíbulo infantil? Como vocês podem dizer que Lolita não tinha consciência plena de seus atos se, mesmo antes de ficar com Humbert, já havia tido relações com um garoto no acampamento (Charlie), por repetidas vezes?

"Por que então este horror de que não consigo me livrar? Tê-la-ei privado de sua flor? Sensíveis senhoras do júri, sequer fui o seu primeiro amante."

      Enfim, eu li e assisti Lolita diversas vezes. E digo sem medo que Dolores fez o que fez porque quis, e não porque foi obrigada.

      Por outro lado, concordo que, em certas passagens (mas isso somente após a entrega total e consentida de Lolita, e no livro isso é muito mais evidente do que no filme), Humbert a ameaçou algumas vezes para conseguir o que queria. Infelizmente, Lolita não tinha outra opção a não ser conviver com ele, e com certeza ele se aproveitou dessa situação. E, por essas vezes, com certeza ele merecia ser punido. Em resumo, eu também acho que Humbert teve culpa na história. Entenderam? Todos têm culpa, até o destino, que fez com que Dolores não tivesse mais para onde ir, a não ser permanecer com seu padrasto.

      Digo isso, pois, no livro, ele mesmo pede para ser condenado, pois o que ele mais sentia falta era a voz de Lolita junto ao coro das vozes das crianças, e não ela em seus braços. Sim, ele se arrependeu das relações que teve com ela, mas eu nunca duvidei do amor que ele sentiu. Na verdade, ambos são culpados pela estranha relação que tiveram. E, com certeza, ele pode ser considerado um louco, doente e pedófilo, talvez, por ter feito o que fez, mas repito: não há dúvidas de que Humbert sempre amou e sempre amará Dolores Haze. Era um amor doentio e obsessivo, mas, ainda assim, amor.

      Caberá a nós, "senhoras e senhores do júri", julgarmos Humbert por todos os crimes que ele supostamente cometeu. Em minha opinião, seu maior crime continua sendo "amar demais".

      Segue trecho do livro que representa a cena final do filme:

"O que eu ouvia era apenas a melodia de crianças brincando, nada mais, e tão límpido era o ar que em meio ao vapor daquelas vozes combinadas, majestosas e mínimas, remotas e magicamente próximas, reveladoras e divinamente enigmáticas - podia-se ouvir de tempos em tempos, como que desprendido, um jorro quase articulado de riso animado (...) Fiquei ouvindo aquela vibração musical da minha encosta distante, esses relances de exclamações isoladas com uma espécie de murmúrio contido a lhes servir de fundo, e então percebi que a coisa desesperadamente dolorosa não era Lolita ausente do meu lado, mas a voz dela ausente de toda aquela harmonia."

      Para concluir, quero deixar bem claro que não sou a favor desse crime horrendo. Cada um tem o direito de interpretar o romance da melhor maneira que lhe convém. Cada um tem o livre-arbítrio para enxergar a beleza até nas situações mais impossíveis e improváveis. E se você é contra tudo isso que eu escrevi, ótimo. Porque todos têm sua liberdade de expressão garantida no artigo 5º, inciso IX, da Constituição da República Brasileira. Ainda bem. Como já dizia Kant: "A verdade ou a falsidade de afirmações e teorias devem ser julgadas pelo pensamento próprio de cada um".

      Dessa forma, podemos ir à resenha do filme em si.

      Esse filme, como o anterior sobre o qual comentei (Túmulo dos Vagalumes), também começa pelo final; não exatamente a cena final, mas um final considerável no qual conseguimos ter uma noção sobre a amplitude dos sentimentos do professor Humbert. Após isso, o filme volta a ter uma ordem cronológica lógica, que nos permite descobrir, em uma linda cena, o encontro entre Dolores e o professor.


      professor Humbert precisa de um local para se hospedar e, neste contexto, surge a Senhora Haze, mãe de Dolores, oferecendo-lhe sua casa. Claramente podemos ver que, desde o início, seu interesse no professor, tanto que insiste para que ele se hospede em sua casa por um valor bem pequeno. Charlotte Haze é uma mulher bonita e bem arrumada, diferente da versão do filme de Kubrick. Portanto, poderíamos pensar que não existiriam motivos para que, talvez, algum dia, o professor não se apaixonasse por ela; mas, alguns minutos depois, o filme nos mostra o motivo de toda a paixão e desgraça das coisas que ocorreriam na vida de HumbertDolores Haze - nossa ninfeta Lolita.

      Eu, particularmente, acho essa cena muito bonita. A expressão facial e a emoção que o professor Humbert demonstra é algo muito real – parece até que o Jeremy Irons não estava interpretando (vai saber, né?). Podemos ver claramente a paixão, até mesmo amor, naqueles olhos que, brilhando, vão de encontro aos olhos de Lolita. É tão lindo que até mesmo nós, meros espectadores, conseguimos sentir a profundidade daquele sentimento.



      Em seguida, o filme revela a origem dessa paixão devastadora por Lolita, que ocorreu durante a adolescência de Humbert. Quando ele tinha 14 anos, ele teve seu primeiro amor. Porém, certos infortúnios aconteceram, fazendo com que uma ferida se abrisse em seu coração e nunca fosse fechada, curada, até o presente momento. O momento em que ele encontra Dolores, também com 14 anos.

      Espero que vocês saibam que ter 14 anos não é motivo para ser puro, ingênuo, infantil e todas as outras características típicas de uma criança. Essa não é nossa realidade atual. E até em épocas mais remotas isso não ocorria de tal maneira. Nem todas pessoas são iguais. Existem meninas que, mesmo com pouca idade, já se mostram sexualmente desenvolvidas e com interesses que vão além de assuntos infantis. E é esse o foco que podemos encaixar em nossa Lolita: ela, desde o início, percebendo que Humbert era loucamente apaixonado por ela, provoca-o com olhares, toques, enfim, todas as armas de sedução que uma mulher possui (diferente do filme do Kubrick, que, como foi feito em uma época diferente, precisou ser censurado).



      Como expliquei anteriormente, existem pessoas que afirmam veementemente que Humbert é louco, doente e pedófilo (e eu concordo parcialmente em alguns pontos), mas, quando assistimos ao filme ou lemos o livro, o foco muda aos poucos: não há como ser completamente a favor de Dolores ou de Humbert. Não podemos dizer que houve apenas culpa por parte de Lolita ou de Humbert, pois isso seria uma inverdade – a mãe de Dolores, por sempre contrariá-la e nunca lhe dar uma educação e carinho suficientes, e também o próprio Humbert, por saber ser errado se relacionar amorosamente com sua enteada, possuem suas parcelas de culpa.

"Eu te amava. Não passava de um monstro pentápode, mas te amava. Fui desprezível e brutal, e torpe, e tudo o mais, mas je t'aimais, je t'aimais! E houve momentos em que eu sabia como te sentias, e a consciência disso era um inferno, minha pequena."

      Mesmo assim, nada me faz deixar de pensar que a parcela maior de culpa é de Lolita. É claro que, devido a certos acontecimentos durante a história, ela se torna uma garota sozinha, tendo apenas ao professor para se socorrer. Mas as atitudes desprezíveis que ela toma em relação a Humbert, além de toda a indiferença demonstrada, é algo que machuca até o coração de quem antes torcia contra ele - ela o manipula e o trata como se fosse um animal indesejado. Não é à toa que muitas vezes ele se irritava com ela; antes mesmo de existir uma relação entre os dois, Dolores já era uma adolescente com pouca educação, desrespeitosa, teimosa e que agia o tempo todo com concupiscência.


      E Humbert literalmente se entrega aos braços de Lo. Ele acata a todos os seus pedidos e, quando erra em relação a qualquer coisa, corre atrás dela com tantas desculpas que você até se cansa de ouvir "I'm sorry". Ele se torna um capacho. Ele vive por ela. O ar que ele respira existe apenas devido à existência de Lo. E ao mesmo tempo em que ele a trata como uma amante, também desempenha o papel de pai. Por mais errado e estranho que fosse esse relacionamento, ele sempre prezou pelos cuidados de Lolita.

"Apesar de nossos arrufos, apesar da maldade que ela exercia, apesar de todo o esperneio e de todas as caretas que me dirigia, da vulgaridade, do perigo e da horrível desesperança de tudo, eu ainda flutuava nas profundezas do meu paraíso de eleição - um paraíso cujos céus tinham a cor das chamas do inferno -, mas ainda assim um paraíso."

      Eu gosto tanto assim desse filme exatamente pelo sentimento de esperança que percorre nossa alma - no começo, mesmo você sabendo e sentindo que essa Lolita vai destruir a vida de Humbert, você ainda acredita que o destino terá um papel fundamental na mudança dos acontecimentos, e que as coisas irão melhorar. Entretanto, as atitudes de Lolita se mostram tão ofensivas para com o homem que a ama, que você começa a mudar, aos poucos, de opinião. Pelo menos é essa a visão que eu tenho do filme (e também do livro). Para mim, Lo recebeu um amor muito maior do que realmente merecia. Ela faz tudo o que quer com o coração de Humbert, no pior sentido possível. A ferida que ele cita no começo do filme, que permaneceu aberta desde quando amou Anabelle (seu primeiro amor, aos 14 anos), com certeza se transformou em algo maior e sem cura depois que Lo entrou em sua vida.

      E, mesmo com todos os apesares, mesmo admitindo que foi tratado como um ninguém e que todos os horrores que aconteceram em sua vida dependeram da existência dessa garota, Humbert reconhece que a ama, sempre amou e sempre amará. Apesar do desprezo de Lo, apesar de ela lhe dizer que preferia viver com Quilty, Humbert ainda se humilha e insiste que ela volte para seus braços.

"'Uma última coisa', disse eu em meu inglês horrivelmente cuidadoso, ‘tem mesmo certeza total de que - bem, não amanhã, é claro, nem depois de amanhã, mas - bem - um dia, qualquer dia, você não quer vir viver comigo? Crio um Deus novo em folha, a quem agradecerei com uivos lancinantes, caso você me dê a mais microscópica esperança.'"

      Em minha percepção, Jeremy Irons permanecerá permanentemente no papel de Humbert Humbert. Sobre sua atuação, me faltam adjetivos. Mas, posso simplificar com um "sensacional". Possuo a mesma opinião em relação à atuação de Dominique Swain, como Lolita. Intensidade foi o que não faltou no resultado final.


      Ainda, mostro aqui mais razões por eu preferir a versão de 1997. Vamos, então, aos atores que interpretaram o professor Humbert: na versão do diretor Kubrick, quem desempenha este papel é James Mason e, na versão do diretor Adrian Lyne, tenho orgulho de anunciar que, como todos já sabem, o merecido papel foi para Jeremy Irons

      Jeremy Irons foi uma escolha corretíssima para esse papel... Já na versão do Kubrick, não tenho muito o que comentar. James Mason é um notório e ótimo ator, entretanto, no quesito beleza, deixa a desejar, como é possível visualizar na imagem abaixo. Acredito que todos concordam comigo neste quesito (e, se não concordam, por favor, procurem um oftalmologista).


      E, para quem tiver curiosidade sobre a aparência das duas Lolitas, a imagem abaixo também vai esclarecer essa dúvida. Particularmente, ainda prefiro a Dominique Swain (1997 - imagem à sua direita), mesmo a Sue Lyon (1962 - imagem à sua esquerda) parecendo ser mais bela. Acredito que Dominique, à época da gravação do filme, possuía as características necessárias para desempenhar a personalidade da Lolita descrita no livro de Nabokov.


      Aliás, a Dominique desempenhou um papel tão sensacional e se entregou tão profundamente à sua personagem que, em um dos ensaios para o filme, ela simplesmente chorou, sem ajuda de qualquer artifício (e, salvo engano, aquela cena não necessitava de tanta profundidade, e nem estava no roteiro que ela deveria chorar). Vocês podem conferir no vídeo abaixo:


      Para quem gostou de ver o vídeo acima, há outro que também mostra um dos ensaios da Dominique Swain para o filme: http://www.youtube.com/watch?v=QzM6K_0hjaY.

      Dou meus parabéns para Adrian Lyne por esse filme excepcional. Quem leu o livro vai entender exatamente o motivo - ele se manteve fiel o tempo todo; foi uma reprodução sincera e maravilhosa do livro Lolita, de Vladimir Nabokov.

"Mas quem poderia querer dificultar a existência daquela luminosa e adorada criatura? Já mencionei que seu braço nu apresentava o 8 das vacinações? Que eu a amava perdidamente? Que ela tinha só catorze anos?"

      Mais algumas curiosidades: esse filme teve outras oito cenas gravadas que, infelizmente, foram deletadas. Depois que li o livro, achei que pelo menos duas delas deveriam ter permanecido no filme (cenas nº 02 e nº 08), de tão fiéis e sensacionais que ficaram em relação ao livro. Enfim, Adrian Lyne fez o que acreditou ser o melhor para o filme, mas ainda podemos ter o prazer de poder visualizar essas oito cenas, que estão disponíveis no YouTube e aqui no blog, nos links abaixo:

      Cena deletada nº 01: http://www.youtube.com/watch?v=FyuhaJMIAaI
      Cena deletada nº 02: http://www.youtube.com/watch?v=tH1mEBn2tyE
      Cena deletada nº 03: http://www.youtube.com/watch?v=ZIeMEeFTVto
      Cena deletada nº 04: http://www.youtube.com/watch?v=w5A9eWgXrSI
      Cena deletada nº 05: http://www.youtube.com/watch?v=PJh00AoUFyo
      Cena deletada nº 06: http://www.youtube.com/watch?v=Raomi4SqVAQ
      Cena deletada nº 07: http://www.youtube.com/watch?v=fw4Tl5ncEcM
      Cena deletada nº 08: http://www.youtube.com/watch?v=03sySC6F8NM

      "E eu não conseguia parar de olhar para ela, e soube tão claramente como sei agora, que estou prestes a morrer, que a amava mais que tudo que já vi ou imaginei na Terra, ou esperei descobrir em qualquer outro lugar."

Resenha por: Rebeca Reale

      Link para download (formato RMVB legendado):
      Clique aqui.