domingo, 24 de fevereiro de 2013

Suave é a Noite

      Claro que todas as resenhas que eu faço são pra vocês, leitores do blog. Mas essa é especial <3

TENDER IS THE NIGHT (1962) 



      O filme começa com um casal e dois rapazes na praia na Riviera Francesa, planejando uma festa em comemoração ao 04 de julho. Tratam-se de Nicole (Jennifer Jones), casada com o médico Dick (Jason Robards); Abe North (Tom Ewell) e Tommy (Cesare Danova). Para a festa, eles convidam dois casais que também estavam na praia, e uma bonita atriz, Rosemary Hoyt (Jill St. John).

(Da esquerda para a direita: Abe, Tommy, Dick e Nicole)

(Rosemary Hoyt)      

      Na festa, tudo corria bem, até que Nicole tem um acesso de ciúme ao ver Dick indo ao jardim com Rosemary (que se insinua bastante para o anfitrião – até irrita, sério). No dia seguinte, o médico, em seu escritório, começa a se lembrar do passado, e, consequentemente, de como conheceu sua esposa e amor de sua vida.


      Nicole tinha sérios problemas psicológicos por causa de seu pai. Em decorrência deles, sua irmã, Baby Warren (Joan Fontaine), torna-se sua tutora legal e a interna em várias clínicas psiquiátricas. Mas a única em que houve significativos progressos foi a do Dr. Dohmler (Paul Lukas), em Zurique, na Suíça, na qual Dick era responsável direto pelo tratamento.


      Era perceptível que havia um romance entre médico e paciente, por mais que o doutor quisesse evitar a situação. É emblemática, então, a conversa entre Dick e o Dr. Dohmler, em que o primeiro confessa estar apaixonado por Nicole. O experiente psiquiatra apresenta sua teoria: por mais que houvesse amor entre o casal, sua história era fadada ao fracasso, pois Nicole via Dick não apenas como um homem, mas como um deus ou qualquer outro ente divino. Um dia, porém, ela perceberia que seu marido não era tudo isso, e se decepcionaria, provavelmente, a ponto de se separar.


      Dick dá alta à Nicole, e não lhe dá esperanças de um romance. Tempos depois, eles se encontram casualmente, ela o convida para um jantar e o amor floresce; a cena seguinte é o casamento deles. Bom ressaltar que Dick deixa bem claro seu desinteresse pela fortuna da esposa.  Eles vivem tranquilos por um tempo, e ele, inclusive, deixa sua carreira de lado na Suíça para continuar na Riviera Francesa.

      O flashback acaba bem após uma festa de ano novo, em que Nicole se nega veementemente a voltar para a Suíça. Ela acorda (trata-se do dia seguinte à festa comemorativa da Independência americana, aquela do início do filme) e diz que quer atravessar a baía de barco, mas Dick se nega, e convence a mulher de que precisa voltar a trabalhar, precisa “salvar os dois”. Eles vão, então, para Zurique.



      A ideia do médico é se unir a um antigo amigo, Dr. Franz (Sanford Meisner) para assumir a clínica do Dr. Dohmler, já velho e doente. Eles começam o negócio, mas as coisas não funcionam muito pra Dick. A partir daí, segue-se uma série de acontecimentos que vão colocando em risco não só a carreira do psiquiatra, mas também seu casamento, visto que, desde o fim do tratamento de Nicole, ele abandonou a carreira e passou a se tornar extremamente dependente da esposa, tanto emocional quanto financeiramente.

      Deixo aqui pra vocês, então, a curiosidade em saber se a teoria do Dr. Dohmler se concretizou ou não. E o que mais aconteceu ao casal.

      Tender is the Night é uma grande história de amor, embebida por uma sensacional trilha sonora (cujo carro-chefe, digamos, é uma música de mesmo nome, composta por Sammy Fain e Paul Francis Webster). Trata não só da relação entre o casal protagonista, mas de questões relacionadas à personalidade de cada um dos envolvidos na história. Todos têm uma característica específica; Dick e Nicole, inclusive, apresentam uma evolução – ou involução? – incrível no decorrer da trama. 

      Sei que pode parecer absurdo, mas fiz uma comparação entre esse filme e Casablanca. Ainda que 20 anos separem uma obra da outra (o primeiro é de 1962 e o segundo, de 1942), há uma série de aspectos que se aproximam, desde a belíssima trilha sonora até a abordagem de um romance, que não se sabe se pode ou não dar certo.

      Rick e Dick assemelham-se, pelo menos pra mim, não apenas no nome. São homens fortes, mas com um ponto fraco: o amor. Nenhum dos dois é decididamente um bom moço; assim como Nicole e Ilsa também podem não ser as mocinhas perfeitas. Sei que tudo isso pode parecer um impropério para os cinéfilos, mas comparei, e pronto.

      São dois filmes decididamente maravilhosos, obras de arte, sem dúvida. Tender is the Night foi uma recomendação muito especial, e deveria ser mais reconhecido (apenas 20 pessoas o viram e marcaram no Filmow, por exemplo). Enfim, ainda que tenha dado um bocado de trabalho para encontrar, valeu o esforço. Super recomendo, até a próxima.


      Link para download: o filme completo pode ser encontrado no Youtube, mas sem legenda.

Resenha por: Stephanie Eschiapati

sábado, 23 de fevereiro de 2013

O Substituto (Desapego)

E nunca me senti tão profundo e ao mesmo tempo tão alheio de mim 
e tão presente no mundo” – Albert Camus.

DETACHMENT (2011)



      Detachment significa indiferença, distanciamento, desinteresse. O filme, no cinema nacional, já teve o nome de “Desapego”, o que faz jus a trama. Porém, como o brasileiro sempre gosta de piorar o que já está bom, traduziu Detachment de forma ordinária para: O SUBSTITO. Mas OK, a gente supera. Já aconteceram tantas traduções chulas nesse Brasil, que a gente acaba se acostumando, como tudo na vida.

      Enfim, here we go: dirigido por Tony Kaye (A Outra História Americana), o filme relata a história de Henry Barthes (Adrien Brody), um professor substituto que vai rumo ao seu novo emprego. A escola em que vai lecionar comporta os mais variados tipos de alunos, mas, em sua maioria esmagadora, aqueles que não dão a mínima ao professor, ao ensino e à escola. Resumindo: é um lugar que reúne os mais preconceituosos e violentos tipos. Sua relação vai ter como patamar quatro importantes bases: uma prostituta menor de idade, chamada Erica (Sami Gayle), uma professora da escola (Christina Hendricks), seu avô doente (Louis Zorich) e uma aluna, Meredith (Betty Kaye), que possui uma doença chamada obesidade.



      No decorrer do filme, flashbacks em paleta vermelha revelam momentos de sua infância, mais ou menos quando Henry tinha 7 anos. São momentos que, apesar de confusos no início, nos permitem perceber os motivos que levaram Henry a se tornar uma pessoa tão triste e alheia ao mundo ao seu redor. Cenas que envolvem imagens de sua mãe, mais as alucinações que seu avô tem, quando chama pelo seu nome e conversa com ela, sempre pedindo desculpas, apesar de ela já estar morta, nos trazem indícios de que alguma coisa ruim aconteceu na história dos dois. Mas Henry, com a pouca idade que tinha, nunca pôde compreender do que se tratava, por isso tem apenas lembranças vagas e insuficientes dos acontecimentos que ocorreram em sua infância.



      Não vou me atrever a julgar essa parte da relação com seu avô e sua infância como menos importante para a película. Acho que todos os momentos do filme possuem um certo peso essencial, que não podem ser excluídos. Logo, em decorrência, não vou dizer que o tema principal do filme é a educação norte-americana defasada. Dependendo do ponto de vista de cada um, pode ser que essa seja a parte principal, mas também pode ser que não a seja, devido a tantas outras partes importantes (como a crise existencialista, que é super abordada nesse filme).


      A próxima relação que vou discriminar, uma das mais bonitas e emocionantes do filme, é com a prostituta menor de idade, chamada Erica. Apesar de ser um tanto quanto niilista e alheio ao mundo, ele decide acomodá-la em sua casa, primeiro, por se tratar de uma criança, segundo, por ele ver o quão prejudicada pela vida ela foi, tanto no sentido físico quanto no mental. A relação que ele desenvolve com ela me lembrou muito a do Léon e Mathilda, no filme Léon (O Profissional, 1994). Quem já viu esse filme entende a beleza que o contato entre uma criança e um adulto desconhecidos pode estabelecer. Apesar de se dar bem com a pequena, seu perfil de desapego não desaparece, e ele sempre toma decisões que nem sempre refletem seus verdadeiros desejos.




      Uma das personagens mais marcantes desse filme é Meredith, garota obesa que é humilhada por várias pessoas, inclusive por seus pais (no filme, mostra especificamente as humilhações de seu pai). A questão da vida versus a morte, a questão do carpe diem e do suicídio, também são retratadas nesse filme, principalmente personificadas nessa garota. Se a escola comporta os piores tipos de aluno, imaginem a intensidade do bullying que ela sofre. Ela é um dos poucos alunos que realmente se dedicam à educação, e busca no professor Henry um suporte para seus problemas. Existem vários momentos do filme que mostram a relação de Henry com Meredith, e são tão fodas (com o perdão da palavra), e com acontecimentos tão chocantes, que isso se torna mais um forte do filme; dá aquela vontade de voltar o filme alguns minutos só pra apreciar novamente a intensidade das cenas.



      E, por fim, existe a relação dele com a Senhorita Madison (Christina Hendricks), que, apesar de ser efêmera, também é importante. Na essência, essa professora é um tanto quanto igual ao Henry – ela, por exemplo, afirma que possui medo de voltar sexta-feira de noite pra casa, pois não sabe como vai lidar com a vida que tem fora da escola. O apego que ela criou dentro do estabelecimento educacional transformou-a numa pessoa que não sabe lidar com o mundo afora.


      A crise existencial, posso afirmar, é o tema mais abordado nesse filme. Todos os personagens possuem problemas familiares, o que pode ser um dos principais fatores que os tornaram como são. Todos carregam uma máscara de suposto equilíbrio, satisfação, constância; mas, quando largam o expediente e voltam para suas casas, a situação se inverte, e o que antes foi disfarçado, explode em situações de tristeza e raiva. Resumindo, é como diz a música: vou negando as aparências, disfarçando as evidências. Uma das cenas mostra quando o véu cai e o sentimento de ódio, raiva, cansaço e insatisfação estoura sem controle – quando a psicopedagoga, Doutora Parker (Lucy Liu), joga na cara de uma aluna palavras fortes e realistas, sobre como é a falta de ambição que os alunos têm e que restará a ela (a aluna), se conseguir, apenas a sobrevivência à base de um salário mínimo.



      O papel do filme não é ser moralista, mas sim realista. O comodismo que existe atualmente é um dos principais alvos criticados. Muitas das pessoas que viram o filme disseram sentir-se deprimidas quando lembravam das cenas. Do jeito que o filme é montado, principalmente com o corte das cenas e com a trilha sonora ao fundo, realmente traz um sentimento estranho e angustiante. A filmagem é diferente da tradicional; é aquilo que muitos chamam de filme “alternativo”. Mas isso não impede que seja um filme maravilhoso; aliás, isso faz com o filme pareça mais intenso a cada minuto que passa. Você começa a assistir e a vontade de pausar, nem que seja pra ir ao banheiro, não existe mais. O filme simplesmente flui.

      Até que ponto a vida vale a pena? Não seria mais fácil se desapegar de tudo e todos, no sentido de não deixar o sentimento interferir nas relações? A morte não é o lado mais calmo? Se uma vida é cheia de tristeza e sofrimento, deveriam as pessoas escolher o outro lado, por ser mais fácil? De onde surgem tantos problemas, se apenas o que fazemos é nos esforçar pra fazer do mundo um lugar melhor? Até quando conseguiremos suportar a imensa pressão da sociedade sobre nossos ombros? Deduzi que essas são as principais questões abordadas no filme, e, resumindo em apenas uma pergunta: devemos continuar vivos?


      E, pra finalizar: mesmo que o filme fosse ruim, valeria a pena assisti-lo apenas pelo Adrien Brody (O Pianista). Gente, que ator é esse, hein?! Suas interpretações são tão magníficas que beiram ao real. Então, se alguém tem dúvida em assistir ou não a esse filme, veja apenas pelo Adrien, porque esse cara é brilhante.


Resenha por: Rebeca Reale

      Link para download (formatos RMVB legendado e HD):
      Clique aqui.

As Vantagens de Ser Invisível

      NOVIDADE: além dos posts feitos por mim (Rebeca), e pela Stephanie, abrimos lugar para que outras opiniões sobre filmes se encaixem em nosso blog. Portanto, nessa seção de posts especiais, tenho o prazer de deixar aqui o post do Gian, sobre o filme As Vantagens de Ser Invisível.

THE PERKS OF BEING A WALLFLOWER (2012)


      O nome estranho remete a pensamentos sobre o que o filme poderia abordar, ou então, o que seria ‘ser invisível’. Primeiramente, antes de entender tudo ou qualquer coisa que o filme possa querer mostrar, é bom apenas ter em mente que tipo de filme é este, e a melhor resposta é: filme impessoal, atemporal e sem localização. Salvo as menções sobre Universidades que nos remetem aos EUA, o filme poderia estar contando a história de qualquer um, em qualquer fase de sua vida.


      Charlie (Logan Lerman) é um garoto de 15 que escreve cartas para um amigo, e não obtém retorno algum, pois é assim que ele quer. Ele começa narrando sua história com o medo que está para enfrentar o primeiro dos 1385 dias de Ensino Médio, apontando suas preocupações para essa época de sua vida:

- Ele não tem amigos, nem com quem se sentar no horário do almoço;
- Tem medo por ser um aluno exemplar na aula de inglês avançado, e medo de ser incompreendido por isso, e por outras coisas;
- Não quer que seus pais achem que ele piorou e...
- Ele não quer piorar.


      O que pareceria um típico filme americano sobre bullying e ‘populars X nerds’ mostra sua complexidade entrando em cada personagem e mostrando os verdadeiros sentimentos e temores, aparências e essências de cada um. Aquele que assistir ao filme e não se identificar com qualquer que seja o personagem da trama, ou não prestou atenção no mesmo, ou ele próprio não se conhece.

      Charlie, então, se direciona para um aluno que ele acha engraçado e que não o trata com indiferença ou asco, como qualquer outro veterano faria. Patrick (Ezra Miller), ou o ‘Nada’, o convida para entrar em seu grupo de desajustados, juntamente com sua meia-irmã Sam (Emma Watson) e começa a viver. Seu medo de piorar novamente e o fato de ter perdido seu melhor amigo Michael no ano passado, que cometera suicídio, começam a se esvair em sua mente, deixando-o mais leve, solto, e aberto a novas experiências, como ouvir as músicas boas que Sam mostra a ele, sair com meninas e experimentar drogas.


      Em flashbacks, Charlie se relembra de sua Tia Helen, que fora a pessoa que ele mais amou dentro de sua família, até certo momento, quando conhece o ‘amor.’ Charlie foca e mergulha no âmago das pessoas, tentando entendê-las, tentando fazer bem a elas, mesmo em detrimento de sua própria pessoa. É mais ou menos aí que vive o perigo em piorar novamente, que seria o fato de Charlie ter entrado em profundo desespero e tristeza em certa parte de sua vida.

      Não vou me aprofundar em nenhuma das características intrínsecas a cada personagem, embora os temas sexualidade e amor sejam os mais abordados no filme.


      Impossível de deixar de lado as atuações no filme. Logan Lerman deixa seus pretensiosos Percy Jackson e O Ladrão de Raios e The Three Musketeers (Os Três Mosqueteiros) para assumir um perfeito Charlie, cativante e aberto para que qualquer um se encaixe em seu papel. Ezra Miller, após a brilhante atuação em We Need To Talk About Kevin (Precisamos Falar Sobre o Kevin), abre mão do antigo personagem fechado para se tornar o extrovertido Patrick de maneira esplêndida, merecendo o Oscar, talvez, em minha opinião, para ambos. E por fim, mas não menos importante, Emma Watson se despede da perfeita Hermione Granger (série Harry Potter) para se tornar Sam, em nada comparada à antiga personagem, de maneira muito bem interpretada e apaixonante.

      A mensagem que captei do filme foi a seguinte: Ame, não passe os outros à sua frente, não deixe de mostrar seus sentimentos, e entenda os outros do seu ponto de vista, pois você é uma flor do papel de parede, você é invisível, ocupa uma posição inatingível de observação, então a use. Assim como use tudo, experimente tudo, seja extensível, seja infinito.

"We are infinite"


      Link para download (formatos AVI, MP4 e Blu-Ray):
      Clique aqui.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

O Homem que Não Estava Lá

      "Sim, eu trabalhava em uma barbearia. Mas nunca me considerei um barbeiro.

THE MAN WHO WASN'T THERE (2001)



      The Man Who Wasn’t  There se passa na década de 1940 e trata da pacata e monótona vida de Ed Crane (Billy Bob Thornton), um barbeiro que trabalha no salão de seu cunhado, Frank (Michael Badalucco). Ed é casado com Doris (Frances McDormand), que, logo à primeira vista, já se mostra completamente diferente dele. Ela trabalha como contadora na loja Nirdlingers, cujo proprietário, Big Dave Brewster (James Gandolfini), é um excêntrico e convencido homem, casado, assim como Ed, com uma esposa completamente diferente de si, Ann (Katherine Borowitz).

(Ed Crane)

(Doris)

(Big Dave Brewster)

(Ann, a assustada esposa de Dave)

      Não só os espectadores percebem logo de cara, mas Ed também sabe que sua esposa e o patrão dela têm um caso. Isso é tão visível que chega a irritar. Mas Ed, no fundo, não se importa; talvez porque não a ame, talvez porque já se conformou que aquele casamento é uma farsa, enfim, tirem suas conclusões. A questão é que, ao contrário do que muita gente faria, Ed não pensa em vingança nem nada parecido por certo tempo.


      Um dia, entretanto, quase no fim do expediente da barbearia, aparece um sujeito falante, que se dizia um grande negociante de passagem pela cidade, Creighton Tolliver (Jon Polito). Segundo o cara, seu negócio era “a maior oportunidade de negócio desde Henry Ford”: lavagem a seco. Ele precisava, porém, de um sócio comanditário (pra quem não sabe, esse tipo de sociedade – a comandita, que hoje não existe mais – demanda um sócio comanditário, que entra com o capital, e um ou mais sócios comanditados, responsáveis pela mão de obra) que apresentasse a razoável quantia de 10 mil dólares pra dar vazão ao negócio. 


      É claro que Ed não dá a menor importância para o falastrão, mas, depois de um tempo, passa a considerar a hipótese de se unir a ele para a tal sociedade. E tem até uma ideia de como conseguir o dinheiro: chantageando Big Dave. Ele, então, manda uma carta anônima ao patrão da esposa, dizendo saber do caso de Dave e Doris, e exigindo 10 mil dólares pra não espalhar a história.

(Tradução: Eu sei sobre você e Doris Crane. Colabore ou Ed Crane saberá. Sua esposa saberá. Todos saberão. Junte 10 mil dólares e aguarde instruções.)

      O mais engraçado é que Dave, no dia de uma festa da Nirdlingers, chama Ed de canto pra conversar e fala exatamente sobre isso. Claro que não cita nomes, mas fica claro que o caso com a “mulher casada” é com Doris. Ele diz que tem medo do que pode acontecer se não pagar o chantagista – e deem um close na “poker face” de Ed enquanto ouve a história –, visto que a loja é de sua esposa, mas não pode pagar sem se quebrar financeiramente.

      Ed não o aconselha, na verdade. Apenas escuta. E Dave paga, o barbeiro pega o dinheiro e, no mesmo dia, vai até Creighton pra entregar o dinheiro e “começar” o negócio. O problema é que Dave descobre tudo, e, numa noite, chama Ed na loja e conta que descobriu tudo. Os dois entram em luta corporal e Ed o mata. Como era tarde da noite e ninguém o viu, ele simplesmente sai da loja e volta pra casa. Tudo – e eu disse tudo mesmo – começa a dar errado a partir daí. Uma história aparentemente simples foge de controle, e a vida do mal-humorado barbeiro Ed Crane vira de pernas pro ar.


      The Man Who Wasn’t There é um retrato simples, mas intenso, de uma vida que tinha tudo pra ser constante do início ao fim. Ed é um ser humano totalmente alheio à sua realidade – ele simplesmente não está lá. Não vi Ed dar uma risada, ou um sorriso aberto, durante quase duas horas de filme. Além disso, o que mais me surpreendeu foram as questões existenciais que ele aborda – desde o crescimento do cabelo humano até seu próprio casamento.

      A narração em primeira pessoa dá a impressão de que você é Ed Crane. E, se você parar pra pensar, você pode ter algo dele. É claro que não tão niilista nem tão azarado, mas, se você é infeliz no casamento, no trabalho, ou insatisfeito com a própria vida que leva, SIM, sinto informar, mas há algo do Crane em você. Cabe a cada um de nós fazer o possível pra que as coisas sejam diferentes.

      Lições de moral à parte (foco, Stephanie, haha), The Man Who Wasn’t There é um ótimo filme. Faz pensar em uma série de coisas, e te surpreende em uma série de pontos – sem dar spoiler, e pra dar um exemplo, tem uma parte do filme que se parece um bocado como filme Lolita (muito bem resenhado pela Rebeca aqui no blog). Enfim, super recomendo. Até a próxima. 


Resenha por: Stephanie Eschiapati

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

De olhos bem fechados

      “Festa estranha, com gente esquisita, eu não tô legal, não aguento mais birita (...)”

EYES WIDE SHUT (1999)



      Eyes Wide Shut conta a história de um casal aparentemente perfeito para os moldes americanos: Dr. Bill Halford (Tom Cruise) é um médico renomado de Nova York, e Alice (Nicole Kidman) é uma curadora de arte, no momento desempregada para cuidar da filha Helena (Madison Eginton). Eles parecem se amar muito, pelo menos.

      Essa é a questão: eles aparentam se amar, mas, na minha opinião, é tudo uma grande farsa. Existe amor, mas este fica embolado em vários outros sentimentos, principalmente no amor próprio de cada um deles. Isso fica perceptível logo no começo do filme, em que eles vão a uma festa de Natal feita por um rico paciente de Bill: nessa festa, eles ficam separados praticamente todo o tempo, e, enquanto Alice dança de modo convidativo com um homem, Bill fica rodando pelo salão de braços dados com duas moças bem bonitas.
   


      Depois dessa festa, o casal volta para o apartamento e, durante uma conversa no quarto, Alice confessa que, em uma das viagens do casal, ela se sentiu fortemente atraída por um marinheiro, a ponto de abandonar a família caso ele a quisesse. Essa confissão bagunçou MUITO a cabeça de Bill, e, ao mesmo tempo, um de seus pacientes morreu.





      Ele teve de sair, e, na casa desse paciente, ele “recebe” uma declaração de amor da filha do falecido. Já abalado, em vez de ir pra casa ele sai andando pela cidade, entra em um bar e se depara com um ex-colega de faculdade, Nick Nightingale (Todd Field) tocando piano. Terminado o show, os dois bebem um drink e o pianista recebe uma ligação para tocar em um local super secreto e cheio de ressalvas e exclusivo para convidados. Bill insiste e consegue a senha do local, e ruma pra lá.


      Primeiro, ele vai a uma loja de fantasias para alugar uma capa e uma máscara, necessários para entrar na referida festa. Até o dono da loja é um sujeito estranho. Ele consegue, pega um táxi e vai pro local indicado pelo colega, diz a senha e entra. Coisa que ele não deveria ter feito. O local da festa tratava-se de uma mansão, ampla, espaçosa e luxuosa. Nele, todos usavam capas pretas e máscaras (o que, pra mim, foi extremamente perturbador), e havia muitas mulheres seminuas dançando e realizando algum tipo de ritual. Era um grande prostíbulo, na verdade.



      Bill ficou perplexo com tudo aquilo e, enquanto ia andando pela mansão, uma das moças o avisou de que não era seguro ficar ali, e que ele estava correndo perigo. Claro que ele não a ouviu, até que descobriram que ele era um intruso e revelaram sua identidade para todos. Ele foi embora, desolado, mas tinha a intenção de esquecer o que houve.



      A partir daí é que as coisas ficam estranhas, porque ele fica com a impressão de que aquela “seita” tinha assassinado seu colega, Nick, bem como a moça que o avisou sobre o perigo que ele corria. O filme, então, passa a mostrar a desesperada investigação de Bill, bem como a distância que ele vai tomando da esposa e da filha. E ele descobre coisa que pode deixar vocês – assim como me deixou – boquiabertos.

      Eyes Wide Shut mostra o jogo de aparências em que se baseiam as relações, desde as mais simples até as mais complexas, como o casamento. Tanto Bill quanto Alice pensam mais em si mesmos que em sua família, e disfarçam isso o máximo que podem. Cada um deles têm seu orgulho, seus desejos contidos e suas frustrações, mas escondem isso sob a casca de um casamento aparentemente feliz.

      Podem me chamar de viajada, mas, assim que terminei de assistir ao filme, a primeira coisa em que pensei foi no livro Dom Casmurro, do meu querido Machado de Assis. Claro que há ressalvas, mas consegui fazer certa comparação entre o Bentinho e o Bill: ambos ficaram transtornados por algo que nem chegou a acontecer (ANTES QUE DIGAM QUALQUER COISA, eu não acredito na traição da Capitu, e não vou entrar nesse mérito), transtorno causado por um misto de insegurança e orgulho ferido. Uma simples suspeita, no caso do Bentinho, e uma confissão, no caso de Bill, tiveram um efeito devastador em ambos.

      Eyes Wide Shut mostra as relações humanas sem censura: desde o sexo sem sentimento, quase que animalesco, em que não é preciso nem se identificar, até o casamento feliz que não passa de aparência. Enfim, é legal pra se pra se pensar, e é do Kubrick também, então a história não teria como ficar maçante ou algo assim. Até mais.

      CURIOSIDADES (que já viraram marca registrada desse blog lindo):

- Eyes Wide Shut foi o último filme de Kubrick, que morreu cinco dias depois de entregar à Warner o corte final do filme;

- Cruise e Kidman eram casados na vida real quando realizaram as filmagens;

- Reza uma lenda – que tem ares de teoria da conspiração –  de que Kubrick teria sido assassinado por explorar, nas cenas da mansão, a essência dos rituais sexuais secretos da elite global, como o Bohemian Club;

- O filme foi baseado no livro Traumnovelle, de Arthur Schnitzler (1926);

- A senha fidelio, usada por Bill pra entrar na mansão, vem do latim “fidelis”, que significa fidelidade.


      Link para download (formatos AVI e MP4):
      Clique aqui.

Resenha por: Stephanie Eschiapati